Collatia, 509 a.C.
Descrição
Pessoas
LocaisTarquínio, o Soberbo, travava guerra contra Ardea. Enquanto a cidade inimiga estava cercada e as operações militares se arrastavam sem conclusão definitiva, os filhos do rei passavam as noites em banquetes no acampamento, muitas vezes na companhia de Colatino, jovem nobre de origem tarquínia e líder de Collatia. Durante uma dessas reuniões, a conversa derivou para o tema das esposas, e cada um passou a elogiar excessivamente a sua. A disputa verbal sobre qual possuía a melhor esposa tornou-se acalorada.
Colatino propôs então que resolvessem a questão empiricamente: ainda havia luz do dia, poderiam montar seus cavalos e verificar pessoalmente o que cada esposa estava fazendo. Partiram imediatamente para Roma. As noras do rei foram encontradas festejando luxuosamente com amigas, ocupadas em diversões. Seguiram então para Collatia, onde encontraram Lucrécia, esposa de Colatino, ocupada com suas lãs no meio da casa, rodeada pelas servas que trabalhavam à luz de lâmpadas. A vitória na disputa cabia claramente a Colatino.
Sexto Tarquínio, ao presenciar a cena, foi tomado por um louco desejo. A beleza de Lucrécia, combinada com sua castidade comprovada, inflamaram nele o que Tito Lívio chamou de "insana obsessão de possuí-la". Poucos dias depois, sem o conhecimento de Colatino, Sexto retornou a Collatia acompanhado de um único servo. Como era parente do marido, foi recebido cordialmente por Lucrécia, que lhe ofereceu hospitalidade. Após o jantar, Sexto foi conduzido ao quarto de hóspedes. Quando julgou que todos dormiam profundamente, foi armado ao quarto de Lucrécia. Colocou a espada sobre seu peito e começou a ameaçá-la.
Lucrécia ouviu Sexto declarar seu amor, misturando súplicas e ameaças. Vendo que ela permanecia resoluta mesmo diante da ameaça de morte — preferindo morrer honrada a viver desonrada —, Sexto disse por fim que, além de matá-la, colocaria um servo morto e nu ao seu lado, para que todos acreditassem que ela fora morta em flagrante adultério com um escravo. A ameaça à sua reputação póstuma, que desonraria não apenas sua memória mas também seu marido e família, quebrou finalmente a resistência de Lucrécia. Vencida pela ameaça infame, cedeu à violação.
Quando o dia amanheceu, Sexto partiu, orgulhoso de sua suposta conquista. Lucrécia, devastada, mandou imediatamente mensageiros chamar seu pai em Roma e seu marido em Ardea, pedindo que viessem com um amigo de confiança. Seu pai trouxe Públio Valério; Colatino trouxe Lúcio Júnio Brutus, com quem casualmente se encontrava retornando a Roma quando o mensageiro o alcançou.
Encontraram Lucrécia sentada em seu quarto, destroçada. Ao vê-los, contou-lhes tudo o que havia sucedido, não deixando de pedir também para que não deixassem impune tal crime. Todos lhe deram a palavra. Tentaram consolá-la, dizendo que a intenção é que peca, não o corpo, e que onde não houve consentimento, não houve culpa. Tito Lívio conta-nos que Lucrécia, no entanto, respondeu: "Vós vereis o que lhe cabe. Quanto a mim, embora me absolva da culpa, não me eximo da punição. Que daqui para a frente, após o exemplo de Lucrécia, nenhuma mulher viva em desonra!" Enquanto falava, cravou uma faca que mantinha escondida sob as roupas em seu coração e caiu morta sobre a ferida.
Enquanto marido e pai choravam desesperados, Brutus retirou a faca da ferida ainda fumegante. Segurando-a alta, gotejando sangue, exclamou em voz solene: "Por este sangue puríssimo antes da injúria do tirano, juro pelos deuses que perseguirei Lúcio Tarquínio Soberbo com sua esposa criminosa e toda sua prole com ferro, fogo e todo poder que eu tiver, e não permitirei que eles nem nenhum outro reinem em Roma!"
O homem que durante anos fingira ser imbecil revelava finalmente sua verdadeira natureza. Passou a faca a Colatino, depois a Lúcio Lucrécio e a Valério, que ficaram estupefatos com o prodígio — de onde vinha aquela nova alma em Brutus? Juraram como ele ordenara. Transformando a dor em fúria, seguiram Brutus imediatamente ao fórum, onde iniciariam a revolução que derrubaria a monarquia.