c. 545 a.C. – 509 a.C.
Lúcio Júnio Brutus nasceu por volta de 545 a.C. em Roma, sendo filho de Marco Júnio e Tarquínia, irmã de Tarquínio, o Soberbo. Esta linhagem dupla — tanto patrícia pela família Júnia quanto conectada à dinastia real etrusca — colocou-o numa posição singular de proximidade ao poder régio mas também de vulnerabilidade política. Cresceu observando de perto os excessos e arbitrariedades do regime tirânico de seu tio.
Durante sua juventude e início da vida adulta, Brutus adotou estratégia de sobrevivência cuidadosamente calculada: cultivou reputação de simplicidade mental, quase estupidez, que o tornava aparentemente inofensivo aos olhos do rei. Esta dissimulação inteligente — fingir ser "brutus" no sentido de obtuso — protegia-o das suspeitas que destruíram outros membros da aristocracia romana que Tarquínio via como ameaças potenciais. Simultaneamente, esta máscara de ingenuidade permitia-lhe circular livremente nos círculos do poder, observando e aprendendo sobre dinâmicas políticas sem despertar vigilância excessiva.
Em 510 a.C., Brutus foi mandado acompanhar os filhos do rei numa missão oficial à Grécia para consultar o Oráculo de Delfos. Tendo chegado a Delfos, os visitantes tiveram a curiosidade de perguntar à sacerdotisa qual deles governaria Roma. A resposta foi que governaria Roma aquele que primeiro beijasse a mãe. Os príncipes interpretaram literalmente a resposta e, de volta à Roma, correram para beijar sua mãe biológica; Brutus, no entanto, compreendeu o significado alegórico e, fingindo tropeçar, beijou a terra, considerando-a a mãe comum de todos os mortais.
Enquanto Tarquínio, o Soberbo guerreava contra Ardea, os filhos do rei e Colatino passavam o tempo no acampamento com festas e bebidas. Durante uma dessas celebrações, cada um começou elogiar sua esposa, até que decidiram verificar pessoalmente qual delas era superior. Montaram a cavalo e partiram juntos: em Roma, as noras do rei foram encontradas festejando com amigas, mas em Collatia, todos contemplaram Lucrécia ocupada em silêncio com suas lãs. A prova de castidade e dedicação doméstica de Lucrécia despertou em Sexto Tarquínio, um dos filhos do rei, uma obsessão doentia de possuí-la.
Algum tempo depois, Sexto retornou sozinho a Collatia, onde foi hospedado cordialmente. Durante a noite, imobilizou Lucrécia em seu quarto e a violou. No dia seguinte, arrasada, ela convocou pai e marido. Quando Spurius Lucretius e Colatino chegaram acompanhados respectivamente de Públio Valério e Brutus, Lucrécia revelou tudo e cravou uma faca em seu próprio coração, não sem antes dizer: "que daqui para a frente, após o exemplo de Lucrécia, nenhuma mulher viva em desonra!" (Tito Lívio, Ab Urbe Condicta) Enquanto os demais estavam em desespero, Brutus retirou a faca da ferida e pronunciou juramento solene: "Por este sangue puríssimo antes da injúria do tirano, juro pelos deuses que perseguirei Lúcio Tarquínio Soberbo com sua esposa criminosa e toda sua prole com ferro, fogo e todo poder, e não permitirei que eles nem nenhum outro reinem em Roma!"
Este momento marcou transformação completa de Brutus: abandonou imediatamente a máscara de simplicidade que cultivara durante anos e revelou-se como líder capaz de galvanizar a resistência contra a tirania. Levou o corpo de Lucrécia ao fórum de Collatia, onde multidão se reuniu. Ali discursou narrando não apenas o crime de Sexto, mas lembrando a todos da arrogância tirânica do rei, dos trabalhos forçados impostos à plebe nas obras públicas, do assassinato de Servio Tullio e do sacrilégio de Túlia ao passar com carruagem sobre o cadáver do próprio pai. Invocando os deuses vingadores, inflamou o povo e exigiu a derrubada da monarquia e o exílio de Tarquínio com toda sua família.
Os jovens se ofereceram voluntariamente e partiram para Roma sob comando de Brutus. No fórum romano, repetiu seu discurso diante de multidão cada vez maior. Deixando Lucrécio no comando da cidade, partiu para Ardea para levantar também o exército acampado contra o rei. Quando a notícia dos eventos chegou a Tarquínio no acampamento, o rei partiu imediatamente para Roma. Brutus, informado de que Tarquínio se aproximava, fez manobra de distração para evitar um confronto direto no caminho. Embora por rotas diferentes, Brutus e Tarquínio chegaram quase simultaneamente: as portas do palácio foram fechadas na cara do rei, que recebeu notícia formal de seu exílio, enquanto Brutus foi recebido com entusiasmo pelos soldados no acampamento, que expulsaram os filhos do rei. Posteriormente, a assembleia das centúrias elegeu dois cônsules: Brutus e Colatino. Era iniciada a República em Roma.